As Estrelas (n.º 12)
Coordenadas Celestes
António Magalhães




Para falar das coordenadas celestes convirá fazer uma comparação com as coordenadas terrestres. Note-se que na explicação que se segue, vamos sistematicamente cometer dois erros de linguagem. 1º vamos dizer que "o Sol passa", que "o Sol atinge", etc. 2º Vamos falar de uma coisa que nem existe: a esfera celeste. Estas linguagem tem no entanto a vantagem de facilitar a compreensão das ideias.

As coordenadas dum lugar na superfície do mar, são a latitude e longitude. Como é que se determina a latitude de um lugar?
Temos antes de mais nada de determinar a localização do equador terrestre. Imaginando uma esfera a girar em volta do seu eixo, (fig.1) o equador é o plano perpendicular a esse eixo onde seja possível o maior diâmetro para um círculo (círculo máximo). Todos os locais da Terra que ficam sobre esse círculo, têm a particularidade de terem o Sol a passar pelo seu zénite nos dias de equinócio. Estes são os dias do ano, em que o dia e a noite têm igual duração em qualquer ponto do planeta, excepto nos pólos, onde o Sol será visto com metade acima e metade abaixo do horizonte durante as 24 horas.

Considera-se latitude de um lugar, a distância angular entre esse ponto e a linha do equador. Imagina-se uma linha recta desde o ponto de observação até ao centro da Terra e mede-se o ângulo formado por essa linha e o plano do equador. Por exemplo um observador no pólo norte terá a linha que o une ao centro da Terra rigorosamente perpendicular ao plano do equador, pelo que a sua latitude será de 90º norte. Se estiver em Lisboa essa linha fará um ângulo de 38,7º N. Os pontos da superfície terrestre que estão a igual distância angular do equador, formam um círculo paralelo ao equador daí o nome de "paralelos". No caso das latitudes, apenas o equador é um círculo máximo. Há alguns paralelos famosos, seja por razões históricas, seja por razões geográficas. Os (trópicos) de Câncer e Capricórnio são os mais referidos. Representam o limite máximo de afastamento do Sol em relação ao equador. Nestes lugares há um dia por ano em que o Sol é visto no zénite e correspondem aos solstícios.

Falta saber como determinar a longitude. Considera-se para referência o meridiano do Observatório de Greenwich. Meridiano é uma linha que unindo os pólos cruza perpendicularmente o equador. O processo de medição é igual ao da latitude, sendo agora o resultado expresso em graus Este ou Oeste. Os meridianos são sempre círculos máximos, com 40 000 km de extensão (*).

Vamos aplicar o mesmo método para o céu. Ao prolongar o plano do equador da Terra até "encontrar" a esfera celeste estará encontrado o equador celeste.

Ao prolongar para norte o eixo de rotação da Terra, encontramos o pólo norte celeste, e para sul o pólo sul celeste. Imaginamos paralelos e meridianos no céu, e fica tudo mais fácil.

Para as coordenadas celestes, substituímos os nomes de latitude por declinação, e o de longitude por ascensão recta.
A declinação ( d ) mede-se em graus Norte ou Sul, ou positivos para Norte e negativos para Sul, precisamente como com a latitude. Portanto é a distância angular até ao equador celeste.

Mas tal como para a longitude, em que foi convencionado que o meridiano de Greenwich seria o de longitude 0 (Zero), foi necessário arranjar um meridiano celeste com essa ascensão recta.

Foi escolhido o ponto em que se dá o equinócio de Março, ou seja, o ponto onde o trajecto aparente do Sol (eclíptica) cruza de Sul para Norte o equador celeste. Tem o nome de ponto vernal, ou do Carneiro (o que não quer dizer que esse ponto fique actualmente na constelação do mesmo nome). Devido à precessão dos equinócios o ponto vernal muda ligeiramente todos os anos, pelo que a referência a determinada AR, se se pretender muito rigorosa, deve indicar a data a que se refere. A Ascensão Recta mede-se a partir do ponto vernal, de oeste para este em horas, minutos e segundos, de 0 a 24 h e não em graus Este ou Oeste. Para dar dois exemplos temos: a estrela Capela da constelação do Cocheiro, que tem uma declinação de 46ºN e ascensão recta de 5h 16min. Sírio do Cão Maior, tem AR 6h 45min e d -16,7º (16,7º Sul).

Em resumo: a declinação está para a esfera celeste como a latitude para a superfície terrestre.
A ascensão recta equivale na esfera celeste à longitude, mas mede-se em horas, minutos e segundos. O meridiano de referência é o que coincide com o ponto da esfera celeste, onde se dá o equinócio de Março.

Há outros sistemas de coordenadas, mas este é o mais claro e útil para os objectivos deste trabalho. Convém referir o sistema que se baseia na "altura" e "azimute", pois isso pode ser útil ao trabalhar com telescópios, assim como para as comparações de observações efectuadas no mesmo lugar em diferentes horas ou dias. A altura mede-se em graus, a partir do horizonte e até determinado astro. O azimute mede-se também em graus, sobre a linha do horizonte, a partir do ponto cardeal sul, até ao ponto onde a linha da altura intercepta esse mesmo horizonte.

(*) Este valor poderá parecer uma espantosa coincidência. De facto os números referentes às dimensões da Terra, são sempre complicados, como por exemplo o raio (6378 km). A razão é simples, a definição de "metro" foi escolhida como sendo a décima milésima parte de um quarto de meridiano terrestre. Portanto não é uma coincidência.

Os esquemas das figuras seguintes foram baseados na obra "Introdução à Astronomia e às Observações Astronómicas" de Ferreira M. e Almeida G., (Plátano Edições Técnicas).