ASTRO-"QUIZ" JOVIANO (#1)

António J. Cidadão

Este "quiz" baseia-se em três imagens de Júpiter (A, B e C), obtidas em 2000 durante a corrente aparição deste planeta, todas elas mostrando a grande mancha vermelha. Estas imagens são demonstrativas das obtidas em diferentes tipos de instrumentos de observação. As questões que coloco são:

1a) qual é a orientação das imagens (N para cima ou para baixo; W celeste para a esquerda ou para a direita)?

1b) se fizessemos uma segunda observação passado uma meia-hora, para onde é que se teria desviado a grande mancha vermelha, devido à rotação do planeta (esquerda ou direita, em cada uma das imagens claro)?

Respostas

Nota: as respostas incluem a designação em língua inglesa das principais formações atmosféricas do planeta.

Analisando as três imagens de Júpiter em que baseia este "quiz", podemos observar que todas elas apresentam bandas alternadamente claras e escuras, orientadas horizontalmente. Estas bandas denominam-se cinturões ("belts"; as mais escuras) e zonas ("zones"; as mais claras), e são paralelas ao equador do planeta. Não há pois qualquer dúvida que o eixo N-S tem que estar orientado verticalmente. Outra confirmação desta afirmação é o facto do diâmetro equatorial do planeta ser consideravelmente maior que o diâmetro polar. Resta saber onde está o N e o S, o que é nitidamente indicado pela posição da grande mancha vermelha (great red spot - GRS). Este enorme anticiclone localiza-se no hemisfério S de Júpiter, entre o cinturão equatorial do sul (southern equatorial belt - SEB) e a zona tropical do sul (southern tropical zone - STrZ). Conclui-se portanto que o N esta para cima nas imagens A e C, e para baixo na imagem B. Há outra observação que confirma o que foi dito, concretamente a posição de regiões focais de cor azulada que neste século têm tido constantemente uma localização na interface entre o cinturão equatorial do norte (northern equatorial belt - NEB) e a zona equatorial (equatorial zone - EZ). Estas formações têm a designação comum de festões ou grinaldas, simples ou em arco (festoons, loop festoons), e sabe-se hoje que a sua origem no NEB corresponde aos chamados pontos quentes ("hot spots"), regiões com muito menos camadas de núvens e por onde escapa, em determinados comprimentos de onda do infravermelho, consideravel fluxo de radiação. Foi numa destas regiões azuladas que entrou a sonda transportada pela Galileu. Contrariamente ao que aconteceu nos últimos anos, nesta aparição de Júpiter os festões não têm apresentado uma exuberância por aí além, mas a figura A (e a C também) apresenta um exemplar típico. Estas variações da morfologia dos festões é apenas um dos muitos exemplos do dinamismo dos fenómenos que ocorrem na atmosfera deste planeta.

Relativamente à orientação E-W, devo confessar que propositadamente não sugeri as coordenadas mais utilizadas actualmente. Desde que a Lua e os outros planetas foram explorados (ou sondados), eles foram considerados verdadeiros "mundos", pelo que a orientação E-W agora adoptada passou a ser a da cartografia terrestre (N para cima W para a esquerda e E para a direita), sendo portanto a inversa da adoptada para a esfera celeste. Além das sobejamente divulgadas coordenadas N-S e E-W, os observadores planetários nas suas tentativas de cronometrar a rotação dos planetas e mapear as posições relativas das diversas formações que neles se visualizam, há muito convencionaram traçar uma linha imaginária que une os polos N e S do disco planetário. Esta linha, designada meridiano central (central meridian - CM) divide o disco planetário em dois hemisférios, a que se convencionou chamar "precedente" (preceeding - "p") e "seguidor" (following - "f"). Porquê? Devido à rotação do planeta, uma dada estrutura aparece no limbo planetário do hemisferio "f", passa pelo meridiano central e localizar-se-á depois no outro hemisferio "p", desaparecendo, passado algum tempo, no limbo planetário "p". Por outras palavras, se tivermos 2 estruturas, uma no hemisfério "p" e outra no hemisfério "f", a primeira precedeu a segunda relativamente à passagem no meridiano central e, óbviamente, a segunda segue a primeira. Mas voltemos à linha de pensamento que iniciou este parágrafo. Em Júpiter, o limbo e hemisfério "f" correspondem ao W cartográfico (E celeste), e os hemisfério e limbo "p" correspondem ao E cartografico (W celeste). Em Júpiter há dois dados que permitem rapidamente orientar as imagens relativamente ao eixo E-W (ou seja "p-f"):

i) no cinturão equatorial do sul (SEB), a W ou seja seguindo a grande mancha vermelha ("f" da GRS), existe caracteristicamente uma acumulação de núvens brilhantes e em turbilhão, a qual contrasta bastante com o aspecto muito mais escuro do SEB a E, ou seja precedendo, a GRS. É nesta região mais brilhante do SEB, a W da GRS, que se admite ser bastante frequente a presença de tempestades de núvens de água e a ocorrência de relâmpagos.
ii) os festões azulados, que referi anteriormente, têm a sua origem na interface entre o NEB e a EZ, dirigindo-se para S e W ("f").

Pelo referido, e passando a responder concretamente ao "quiz":
1a)
A - N para cima, W celeste para a esquerda (W / "f" no planeta para a direita)
B - N para baixo, W celeste para a esquerda (W / "f" no planeta para a direita)
C - N para cima, W celeste para a direita (W / "f" no planeta para a esquerda)

A imagem "A" (imagem em espelho) pode ser obtida num Schmidt-Cassegrain munido de prisma "diagonal", "B" (imagem invertida 180º) observa-se por exemplo numa luneta astronómica, e "C" observar-se-ia, por exemplo, num "super-binóculo" (imagem direita).

1b)
A - GRS desviar-se-ia para a esquerda (sentido W-E ou "f-p")
B - GRS desviar-se-ia para a esquerda (mais uma vez no sentido W-E ou "f-p")
C - GRS desviar-se-ia para a direita (sempre no sentido W-E ou "f-p")